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Conexão UF | Será que a pandemia está perto do fim?

Dra. Larissa Oliva (Foto: Divulgação)
Dra. Larissa Oliva (Foto: Divulgação)

Por Megan Radney

Há mais de um ano desde o começo da pandemia, pelo menos nos Estados Unidos, parece que o fim está à vista. Apesar da recusa de muitos, até o momento, 48% da população que vive nos EUA já recebeu as duas doses da vacina.

A situação nos Estados Unidos é um contraste com a do Brasil, que está passando por um momento mais grave, apesar do avanço da vacinação. No momento em que esta coluna foi escrita, o Brasil é responsável por 33% das mortes por COVID no mundo, apesar de ter apenas 3% da população mundial.

Com certeza a pandemia tem mudado a vida de todos nós. Apesar de ser uma doença respiratória, a covid trouxe ramificações negativas para a saúde mental de muitos, sobretudo os que trabalham no ramo de saúde. André Maia, que atua como psiquiatra na Marinha do Brasil, explica que já percebeu colegas em claro sofrimento e desgaste mental. Ao ser perguntado sobre a experiência de ser médico durante a pandemia, Maia afirma, “É uma experiência desafiadora que exige superação diária. A frustração da sensação de remar sozinho ou com poucos gera uma carga negativa tremenda.” 

Como muitos brasileiros aqui nos Estados Unidos, tenho acompanhado o aumento de casos no Brasil, preocupada por meus parentes e pelo bem-estar do país. Aproveitei o estágio para entrevistar a Dr.ª Larissa Oliva, infectologista que mora em Gainesville (FL), com sua família e seu marido. Segue as perguntas e respostas abaixo: 

Você pode falar um pouco sobre você, seu trabalho atual e como chegou a este caminho? 

Olá! Inicialmente gostaria de agradecer o convite! Eu me chamo Larissa Oliva, sou médica e como eu sempre digo “originalmente infectologista”. Infectologia é a minha grande paixão na área médica. Durante a faculdade de Medicina eu fiquei fascinada pelas doenças infecciosas. Sim, eu sei que pode parecer estranho, mas a complexidade das doenças infecciosas e o seu mecanismo de ação me estimulavam a estudar para entender toda a fisiopatologia ou em uma linguagem simples “como as doenças agem no nosso corpo”. Me formei em 1999 e no ano 2000 iniciei a residência médica no Instituto de Infectologia Emílio Ribas em São Paulo. O Emílio Ribas é um hospital somente para doenças infecciosas e é reconhecido pela sua qualidade no atendimento. No Emílio Ribas eu me deparei com um cotidiano ambíguo, pois ao mesmo tempo que vivenciava histórias de intenso sofrimento pude conviver em um ambiente genuinamente generoso. No meio da gravidade do curso de uma doença infecciosa há um aprendizado intenso do respeito ao outro, sem qualquer tipo de restrição. Paralelamente à infectologia clínica eu comecei a fazer laudos para subsidiar uma ação judicial. Atualmente eu tenho uma empresa de assessoria médica para processos judiciais–processos de “erro médico”, ações trabalhistas, indenizações decorrentes de acidentes pessoais, entre outros. 

A covid-19 afetou seu trabalho e sua vida? De que forma? 

Quanto ao momento atual, a pandemia afetou muito pouco a minha atividade profissional, mas o isolamento teve um grande impacto no meu dia a dia, como para a maioria das pessoas. Além de trabalhar em regime de home office eu me vi em uma cidade nova, aprendendo uma língua nova, sem a minha família e amigos, mas diante do que muitos estão vivendo – perdas irreparáveis – eu avalio que a minha situação é muito privilegiada.

Como tem sido a experiência de ser médica acompanhando a situação no Brasil à distância? O que você tem ouvido dos médicos no Brasil? 

Atualmente moro em Gainesville porque o meu marido faz um mestrado na UF e eu consigo manter o meu trabalho de forma online. Nesse momento da pandemia sinto que a minha família está mais segura do que se nós estivéssemos no Brasil, mas ao mesmo tempo em muitos momentos eu me senti frustrada de não poder trabalhar diretamente nos cuidados assistenciais de indivíduos infectados com a covid. Vivencio diariamente a angústia dos meus amigos médicos que estão atendendo direta ou indiretamente pacientes com a covid. Além do medo de uma doença desconhecida, do medo de adoecerem ou de contaminar a suas próprias famílias, ainda há um ambiente de trabalho totalmente hostil. A ausência de um protocolo de atendimento federal baseado exclusivamente em dados científicos propicia o surgimento de diversas condutas médicas questionáveis e sem nenhuma efetividade. O governo federal empenhou os seus esforços em medidas conhecidas como “kit covid” que inicialmente era composto basicamente pelo uso da Cloroquina. O uso da Cloroquina foi relacionado ao tratamento da covid, pois sabidamente é uma medicação que “potencializa” a resposta do sistema imunológico. Assim, alguns estudos realizados “in vitro”, ou seja, em um tubo de ensaio no laboratório, indicavam que essa medicação poderia inibir a replicação viral e provocar uma ação anti-inflamatória. Infelizmente essa ação se mostrou somente efetiva dentro de um tubo de ensaio. Essa política de saúde sem uma coordenação nacional efetiva atrasou muito as medidas realmente eficazes contra a pandemia e criaram um ambiente propício para que a sociedade não aderisse realmente a medidas de isolamento. E infelizmente estamos vendo o reflexo dessas ações nos hospitais lotados e sem insumos médicos suficientes e no número diário de mortes.

Conhecendo o sistema de saúde nos Estados Unidos e no Brasil, quais são as maiores diferenças? Há alguma mudança no sistema de saúde brasileiro ou estadunidense que deva ser implementada?

A diferença fundamental é que o Brasil tem como modelo básico de saúde o SUS que dá acesso global e gratuito de forma universal a qualquer pessoa que busque atendimento médico. Não há nenhuma regra que valide a sua utilização. Esse sistema tem muitas vantagens, assim como desvantagens que abalam a credibilidade do sistema, como gestões nem sempre eficazes e qualidade do atendimento muito irregular. No Brasil, a saúde é um direito de todos e dever do Estado- segundo a Constituição de 1988–nos Estados Unidos a saúde é entendida como responsabilidade individual, ou seja, há um conceito geral que cada indivíduo deve arcar com suas próprias despesas, sendo o Estado apenas um regulador.

Quando foi a última vez que você viajou ao Brasil? Quando, na sua opinião, seria seguro viajar para o Brasil? As pessoas imunizadas precisam esperar a situação melhorar no Brasil para viajar? 

A última vez que eu viajei para o Brasil foi em fevereiro de 2020. Diante de uma pandemia e da situação atual é impossível prever quando teremos segurança de viajar para o Brasil. Temos ainda que lembrar que o objetivo principal de uma vacinação é a proteção do coletivo. Uma vacinação em massa faz com que o vírus circule menos e assim progressivamente o número de casos novos diminui. Portanto, o mais importante para viajar para o Brasil não é estar vacinado e sim que uma grande parcela da população brasileira esteja vacinada. Isso diminui a chance do contato individual com possíveis mutações virais.

Texto produzido por Megan Radney, com supervisão da Professora Andréa Ferreira e da redação do AcheiUSA.

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