O presidente Donald Trump enviou na quarta-feira (9) uma carta ao presidente brasileiro, Lula da Silva, anunciando um aumento de 50% na cobrança de tarifas sobre produtos brasileiros exportados para os Estados Unidos a partir do dia 1º de agosto.
Trump argumenta que o Brasil tem perseguido o ex-presidente Jair Bolsonaro, que está sendo julgado no Supremo Tribunal Federal (STF) brasileiro por crimes institucionais, como tentativa de abolição do estado de direito e golpe de estado, entre outros. O presidente americano afirma na carta que a forma como o ex-presidente tem sido tratado é “uma vergonha internacional”.
Ainda como argumento para o aumento, Trump diz que a medida foi tomada “em parte devido aos ataques insidiosos do Brasil contra eleições livres e à violação da liberdade de expressão dos americanos”. O presidente trata o julgamento de Bolsonaro como uma “caça às bruxas que deve acabar IMEDIATAMENTE.”
Os ataques referidos por Trump diriam respeito a intervenções do STF junto a plataformas de redes sociais americanas, como o X, que teve a atuação ameaçada no Brasil por acusações de promover a disseminação de desinformação para fins políticos. A rede, que pertence ao bilionário Elon Musk, foi multada, sofreu restrições e voltou a atuar no Brasil. Na época, Musk e Trump eram aliados políticos.
A carta cita também um suposto desequilíbrio no comércio entre os dois países: “Além disso, tivemos anos para discutir nosso relacionamento comercial com o Brasil e concluímos que precisamos nos afastar da longa e muito injusta relação comercial gerada pelas tarifas e barreiras tarifárias e não tarifárias do Brasil. Nosso relacionamento, infelizmente, tem estado longe de ser recíproco”.
A balança comercial entre os dois países, entretanto, é favorável aos Estados Unidos, que exporta para o Brasil mais do que importa. Segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), em 28 anos de registro no comércio exterior os EUA possuem um superávit de $48.2 bilhões no comércio bilateral com o Brasil. Os EUA são o terceiro parceiro comercial do Brasil (atrás da China e da Europa), ficando com cerca de 11% do total das exportações brasileiras. Óleo bruto, produtos de ferro semifaturados, café e carnes bovinas formam a maior parte desse total, mas também há produtos de alta tecnologia, como os aviões da Embraer.
OPINIÃO
A ameaça tarifária não é apenas um tema econômico
Por Marson Cunha*

A escalada tarifária proposta pelos Estados Unidos — especialmente a tarifa de 50% sobre todas as mercadorias brasileiras — representa um golpe econômico severo que pode restringir o crescimento do PIB do Brasil no curto e médio prazo, ao atacar diretamente seu principal motor de exportação. O agronegócio, que tem sustentado a economia brasileira nos últimos 3 a 4 anos, está altamente exposto. Produtos como carne bovina, café e frutas — nos quais o Brasil é competitivo em termos de custo, mas não insubstituível — provavelmente serão substituídos por exportações da Colômbia, Argentina e Vietnã, todos com relações comerciais mais amigáveis com os EUA e sem tarifas semelhantes.
Enquanto isso, os setores de petróleo e gás, siderurgia e aviação — que representam uma parcela significativa das exportações industriais brasileiras — enfrentarão não apenas redução de margens, mas possivelmente exclusão do mercado, especialmente em áreas como aço e componentes aeronáuticos da Embraer, que já sofrem pressão competitiva de produtores norte-americanos. Politicamente, essa medida tende a aprofundar a polarização interna: a direita irá interpretar a retaliação como prova do fracasso da política externa do governo Lula, enquanto a esquerda poderá intensificar narrativas antiamericanas. O julgamento de Bolsonaro, mencionado na carta, corre o risco de se tornar ainda mais inflamável nesse contexto, especialmente se for visto como um fator que motivou a retaliação comercial dos EUA.
Em suma, essa ameaça tarifária não é apenas um tema econômico — é uma alavanca geopolítica com potencial para redirecionar fluxos de exportação, aumentar tensões políticas internas e redefinir as alianças comerciais do Brasil com outros países da América Latina e da Ásia.
*Marson Cunha é presidente da Brazilian-American Chamber of Commerce of Florida (BACCF), a maior câmara de comércio do estado, e que conta como membros importantes atores na relação comercial entre Brasil e Estados Unidos, como Banco do Brasil Americas, Bradesco, Itaú e Embraer.