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Busca por profissionais de saúde aumenta, diz psicóloga em Massachusetts

Brasileiros sentem os efeitos psicológicos do isolamento social

De Massachusetts a psicóloga Herica Apolinário atende brasileiros por videoconferência em diversos países (Foto: Divulgação)
De Massachusetts a psicóloga Herica Apolinário atende brasileiros por videoconferência em diversos países (Foto: Divulgação)

A crise financeira que se abateu sobre a comunidade brasileira causada pela pior pandemia dos últimos 100 anos, não tem deixado apenas as pessoas em vulnerabilidade econômica. Muitos foram contaminados pelo novo coronavírus e sofrem as consequências da doença. Entre um e outro, uma parcela significativa tem também sofrido com os efeitos psicológicos da quarentena e do isolamento social.

O brasileiro foca muito no trabalho, geralmente retirando as fontes de prazer e lazer. Com a chegada da pandemia, e o consequente isolamento social, as poucas opções de lazer, como ir a reunião de amigos e participar de cultos religiosos foi reduzido a quase nada. “Neste sentido, a pandemia acelerou um processo que para muitos era inevitável. Nós somos um povo que vive em comunidade e temos esta necessidade de contato pessoal. Ou seja, o que estava ruim piorou”, explica Herica Apolinário, 32, psicóloga e terapeuta cognitiva comportamental especializada em atendimento de brasileiros por videoconferência em Massachusetts ouvida por esta coluna. 

Em geral ela observou nos pacientes taquicardia, dificuldade em respirar, diminuição nas horas e na qualidade do sono e aquele aperto no peito. “Este aperto no peito é a angústia, um dos sintomas provocados pela ansiedade. Aquela sensação de que algo ruim vai acontecer”, afirma ela completando que este é um sintoma comum a todos os pacientes. O motivo, segundo ela, é o fato das pessoas passarem mais tempo isoladas dentro de casa sem poder sair, assistindo aos telejornais, onde o excesso de notícias ruins sobre a pandemia acaba por contribuir negativamente no estado emocional.

Para Herica, estas são as razões principais que tem levado a maior parte de seus novos clientes a buscar ajuda profissional. Após o início da crise sanitária, houve um aumento grande nos clientes brasileiros. Em apenas um mês o número passou de 27 para 47 pacientes ativos, sem contar as chamadas de emergência que recebe. “Assistimos a pessoas com crises de ansiedade, do pânico e muitos indo aos hospitais pensando ter sido contaminado devido a dificuldade em respirar. Após o primeiro mês notei um aumento também de pessoas com quadro depressivo”, disse ela que tem cinco pacientes que contraíram o novo coronavírus. 

O medo de perder o emprego, ver sua renda mensal diminuir drasticamente e o confinamento levam as pessoas a entrarem em um ciclo vicioso onde a incerteza do futuro resulta na perda de sono, aumento do estresse, síndrome do pânico e até, em alguns casos mais graves, um completo colapso do sistema nervoso. 

Foi o caso de uma das pacientes de Herica. “Ela foi encontrada perambulando pelas ruas sem saber o que se passava ou onde estava. Foi preciso chamar os familiares e interná-la para ser medicada”, explica.

Fadiga da quarentena

Especialistas apontam a chamada “fadiga da quarentena” como o fenômeno que tem levado as pessoas a abandonarem o isolamento social. “Nosso sistema faz esforços para nos adaptar a situações novas e indesejadas, de privação. Mas, quando somos obrigados a fazer isso por muito tempo, esse mecanismo entra em falência e não conseguimos mais racionalizar”, explicou Ricardo Sebastiani, especialista em psicologia clínica e saúde pública ouvido pelo jornal El País.

Herica concorda com a avaliação. “Alguns estavam acreditando, outros não mas a maioria conseguiu levar bem o isolamento até cerca de 30 dias. Depois de 30 dias a pessoa começa a sentir sintomas físicos porém ainda tentando administrar. Nas últimas semanas porém eu notei que muitos já não aguentavam mais e começaram a sair às ruas e relaxar as medidas de segurança ao retornar para casa”, afirma.

Os EUA tem assistido a um ressurgimento do número de infectados em alguns estados, como Flórida e Texas. Parte devido a reabertura de comércios não essenciais. Praias lotadas, bares cheios e festas têm demonstrado ser um dos grandes culpados pelo número de novos casos. Especialistas têm criticado governos e estados que tomaram esta atitude antes de certificar que as estatísticas apontavam para uma curva descendente de novos casos e mortes por Covid-19. “Eu tive pacientes que resolveram, mesmo sabendo dos riscos, tirar alguns dias de férias e voltaram contaminadas”, alerta Herica. 

Mulheres são mais suscetíveis a problemas psicológicos

Herica não concorda com esta afirmação. Mesmo afirmando que a maior parte de seus pacientes serem mulheres, ela explica que a questão cultural dos homens brasileiros é um dos fatores determinantes na hora de buscar ajuda profissional ou não. “As mulheres procuram ajuda mais cedo. O homem procura quando tem um quadro mais avançado, evitando até a última hora por achar que psicólogo é frescura e coisa de louco”, diz ela completando que entre os norte-americanos a percentagem de clientes homens e mulheres é bem próximo. “O homem brasileiro somente busca ajuda em último caso quando recebe um ultimato da companheira ou quando, entre os sintomas está o fraco desempenho sexual por exemplo”.

Saber lidar com a situação pode evitar o pior

Em um ambiente de incerteza na qual todos estão vivendo, não basta apenas se proteger para evitar a contaminação. É preciso também cuidar da saúde mental. Ter objetivos a curto prazo ao invés de pensar no longo prazo é uma das formas que os profissionais acreditam poder ajudar a atravessar esta fase da melhor forma possível. “Ao invés de planejar o mês ou o ano, procure pensar mais a curto prazo. Planeje a semana, ao final da semana planeje a próxima. Isso dá uma sensação de segurança maior. Ao pensar em longo prazo, a incerteza pode provocar desestabilização e causar  crises de ansiedade”, aconselha Herica.

A adaptação é também uma forma importante nestas situações de instabilidade. Ao ver a rotina quebrada, agir de forma adaptativa pode fazer uma grande diferença no psicológico. “Se não dá para ir mais a academia, ao parque, a praia, procure horários alternativos para uma caminha. Se puder, faça uma horta em casa, cuide das plantas. Para quem vive em apartamentos, procure ler um livro, ligar para parentes e amigos”, recomenda. São atitudes pequenas mas que podem ajudar a prevenir e até mesmo curar os sintomas da ansiedade.

“O importante é manter a sanidade física e mental e lembrar do princípio da impermanência, ou seja, nada dura para sempre. Vai passar. É só um período”, finaliza Herica.

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