Jorge Nunes

O juiz que expulsou Pelé

José (Pepe) Teixeira de Carvalho / ACHEIUSA

José Teixeira de Carvalho dizia ter sido o único juiz do mundo que expulsou Pelé, em um jogo perdido lá pelos anos 1960. Estranhamente, o Rei do Futebol teria ficado amigo dele por causa disso. De fato, uma vez apresentou como prova da amizade um convite pessoal que recebeu para uma festa da família do Rei, assinado pelo próprio.

Depois dessa expulsão histórica, o pernambucano Carvalho foi apitar no México, onde ganhou o apelido de Pepe, como é dado a todos os josés do mundo hispânico. Por alguma razão desconhecida, o doravante Pepe Carvalho certo dia apareceu no coração da comunidade brasileira no estado da Flórida – a cidade de Pompano Beach.

Aposentado das canchas, Pepe começou a organizar um torneio de futebol com times patrocinados por empresários brazucas da região. Surgiu a Copa Sambola, mistura de show de música, festa popular, churrasco e torneio de futebol que agitou a brasileirada de Pompano Beach e arredores no começo dos anos 2000.

Pepe organizava tudo, desde o aluguel do campo à contratação dos juízes, e ganhava um troco vendendo patrocínios que estampava no material promocional da Copa e nos anúncios dos jornais comunitários brasileiros da época. Aproveitava e vendia também espaços na carroceria do seu minúsculo Chevrolet Metro Geo, que ficava coberto de logos e decalques de vários formatos e tamanhos, tantos que quase escondiam toda a pintura original.

Numa das edições da Copa Sambola, os juízes não voltaram do intervalo na partida final, disputada entre o time de uma empresa de remessas de dinheiro e outro patrocinado por um restaurante. Depois de alguma confusão, descobriu-se que o trio de arbitragem tinha debandado por falta de pagamento. Pepe era correto nos compromissos, mas daquela vez a Copa Sambola de futebol não tinha ido bem das pernas – com perdão do trocadilho – e sobrou para a arbitragem.

Pepe não se fez de rogado. Apesar dos mais de vinte anos passados desde que tinha pendurado o apito (e pelo menos cinquenta quilos a mais na forma), foi a campo para comandar o segundo tempo da finalíssima.

– Meu filho – ele chamava todo mundo de ‘meu filho’ –, deixa que eu apito.

A atuação foi péssima, menos por conta de alguma parcialidade nas marcações que pela mobilidade do juiz, limitada a pequenos passos nas imediações do círculo central. Porque quando Pepe partia em direção a um dos lados do campo para acompanhar uma jogada, a bola rebatida já ia para o outro time, e ele tinha que mudar a rota. Ficou assim todo o segundo tempo, girando dentro do grande círculo, tentando em vão acompanhar a velocidade do jogo, que milagrosamente terminou sem brigas e com mais um campeão da Copa Sambola.

Depois dos seus dias de glória, a Copa Sambola entrou em rápida decadência. A saúde de Pepe se deteriorou e ele foi obrigado a colocar um marcapasso para controlar o coração. Um dia, acabou a pilha do marcapasso e ele dormiu no volante do seu Metro Geo. Felizmente não aconteceu um acidente, mas ele ganhou um DUI da polícia, porque alguns copos de vinho tinham colaborado com as pilhas do marcapasso para o cochilo.

Com a morte de Pepe, meses depois, a Copa Sambola acabou de vez. No funeral, um pequeno tumulto se formou quando um amigo quis colocar uma garrafinha de vinho no caixão, ao lado do defunto, alegando que fora o pedido último de Pepe Carvalho, o juiz que expulsou Pelé.

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