Tudo começou por causa do protesto pelo aumento de vinte centavos nas tarifas de ônibus de São Paulo, na segunda-feira (17). Mas logo as manifestações populares, formadas principalmente por jovens estudantes, deixaram de ser apenas pelo aumento e se alastraram pelo Brasil no que já é considerado o maior ato popular desde a época do impeachment do ex-presidente Fernando Collor. Dois dias depois do começo dos protestos, o aumento já havia sido revogado, mas os manifestantes continuaram nas ruas. No calor da revolta, a polícia paulista entrou em confronto com os manifestantes desde a segunda-feira (17), e o que se viu em seguida foi um aumento progressivo nos protestos e nos conflitos, que se multiplicaram por outras 120 cidades brasileiras e 50 fora do país. Nos Estados Unidos, Miami e Nova York não ficaram de fora. No fechamento desta edição, na quinta-feira (20) à noite, a Avenida Paulista estava ocupada, centenas de milhares estavam nas ruas do Rio e a multidão tentava invadir o Palácio do Itamaraty em Brasília.
O protesto, que começou com o nome de ‘Movimento do Passe Livre’, foi aos poucos ganhando volume, estimulado pelas redes sociais. As palavras de ordem se espalharam rapidamente e logo o movimento ganhou as ruas das capitais, inclusive Brasília. A revolta surpreendeu os jornalistas e analistas políticos por sua falta de objetivo claro, mas acabou sendo caracterizado como uma revolta genérica contra o sistema político do país, uma reação às décadas de desgoverno e corrupção num país que cresce preso a uma estrutura política arcaica, impedindo que sua prosperidade se espalhe em todos os níveis.
Cantando o Hino Nacional e empunhando cartazes pedindo não mais os vinte centavos, mas investimentos em educação, saúde e transportes e todo o tipo de reivindicações, os manifestantes mostraram que o caso da passagem de ônibus em São Paulo foi apenas um pretexto para disparar um sentimento que estava engasgado na garganta dos brasileiros.
Na terça-feira, a presidente Dilma Rousseff afirmou que considerava as manifestações legítimas, mas a declaração pouco ajudou a acalmar os ânimos, e as revoltas recrudesceram ainda mais. Militantes dos partidos políticos resolveram ir também às ruas e o risco de um confronto generalizado aumentou ainda mais.
Alguns acreditam que finalmente o povo brasileiro resolveu organizar-se e mostrar que está insatisfeito com as atitudes dos políticos no país. Mas, se os protestos perderem o foco e a polícia agir novamente com violência, o cenário pode piorar. Por último, os protestos foram usados como fachada por alguns poucos oportunistas que resolveram saquear lojas, invadir repartições públicas, estações de metrô e bancos. O número já foi suficiente para que em algumas cidades, o comércio resolvesse fechar as portas às 5pm.
As mudanças não pararam no comércio. A presidente Dilma, devido ao clima de apreensão, cancelou a agenda de viagens dos próximos dias. Ela iria a Salvador e depois disso passaria uma semana no Japão.
Mais do que 0,20
Com o tempo, os vinte centavos viraram o símbolo de uma nova lista de demandas. As faixas dizendo “não é só por 0,20”, “queremos educação e saúde de qualidade” e palavras de ordem semelhantes tomaram conta das passeatas. A Proposta de Emenda Constitucional 37, que prevê a retirada do poder de investigação do Ministério Público e pede a reestruturação das carreiras, também foi muito lembrada pelos manifestantes. O projeto de lei conhecido como “cura gay”, pelo qual psicólogos podem propor tratamento para a homossexualidade, também foi motivo de protesto. A proposta foi aprovada pela Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados e agora segue para outras duas comissões da Câmara. Se aprovado, segue para votação no plenário.
O crescimento do movimento de revolta generalizada bem no momento que toda a mídia internacional tem os olhos concentrados no Brasil por causa dos eventos esportivos programados, como a Copa das Confederações, a Copa do Mundo em 2014 e os Jogos Olímpicos em 2016, levou autoridades estrangeiras a opinar sobre o assunto. Algumas visões foram positivas, comentando que finalmente “o gigante acordou”; outras colocaram em dúvida a capacidade do país de abrigar os próximos eventos esportivos programados, e o preparo da polícia para repreender manifestações populares.