Jehozadak Pereira*
Nota: Para os que estão chegando agora e ficaram horrorizados com uma briga depois de EUA 1 x 4 Brasil, na terça-feira, 8 de setembro, saibam que há precedentes. Em 8 de junho de 2008, quando o Brasil de Dunga perdeu da Venezuela por 2 x 0, também houve vexame e constrangimento. Sete anos depois, continuamos os mesmos de sempre. Em 2015, os mesmos de 2008 e quiçá – e pelo andar da carruagem, quando o Brasil voltar ao Gillette Stadium em 2022–estaremos no mesmo lugar. Sem aprender nada.
Precisando aprender
Em todo lugar há os bons e há também aqueles que, mesmo sendo boas pessoas, se comportam de modo como se não fossem. A constatação disto foi o jogo da Seleção brasileira no Gillette Stadium na sexta-feira, 8. O que se viu no entorno do estádio foi uma multidão alegre e descontraída aproveitando a oportunidade para comungar com quem não conhece o churrasco, a cerveja, o bate-papo e as agruras do dia-a-dia.
Famílias inteiras aproveitavam enquanto o jogo não começava ou os portões do estádio não eram abertos para festejar um momento raro de cidadania explícita sem ser incomodado ou molestado. Mais ainda, era a oportunidade de esquecer a saudade, as dificuldades e a distância da pátria amada.
O comportamento da maioria foi absolutamente impecável em todos os aspectos. Mas, como em todos os lugares, há sempre uma minoria problemática que quer arrumar confusão, não importando o tamanho dela. Pois estes extrapolaram. Beberam em demasia e literalmente exageraram na dose.
Aí o vexame foi total. Tinha gente que parecia ter saído de uma prisão onde cumpriram longa pena e quando se viram livres trataram de cometer os desatinos previstos. Tinha gente sentado em lugar que não era o seu ou invadindo espaços onde não podiam entrar e ainda queriam brigar com os funcionários encarregados de cuidar dos lugares.
Uma das provas da insanidade de alguns dos nossos podia ser vista nos banheiros do estádio. Torneiras e porta-toalhas arrancadas, portas chutadas, espelhos cuspidos, papel higiênico devidamente jogado dentro das privadas, saboneteiras danificadas, além das tentativas frustradas de arrancar alguns assentos na hora da raiva.
Toda a ótima impressão deixada em setembro do ano passado foi abalada na sexta-feira. Sem contar que muitos torcedores sentaram-se nos espaços destinados à circulação de pessoas nas arquibancadas e foram retiradas, sendo que algumas chegaram a ser levadas pela polícia.
Fora do estádio, alguns foram presos por desordem, vandalismo e brigas motivadas pelas doses cavalares de cerveja que trataram de embriagar e embotar os sentidos. Logo, o que era para ser exclusivamente alegria e descontração acabou se tornando frustração e raiva com o futebol apresentado pelo ridículo time do técnico Dunga, que não jogou nada.
Ou seja, os milionários e famosos jogadores brasileiros se intimidaram ante os desconhecidos venezuelanos, que pareciam deslumbrados diante da mítica camisa amarela. Mas foi o jogo começar para que os milhares de brasileiros vissem quem de fato jogava bola no gramado do Gillette Stadium.
O comportamento de parte da nossa torcida nos mostra que temos ainda um longo caminho pela frente para saber quem somos e colocar em prática na terra dos outros a exata noção de educação e civilidade que certamente temos. Civilidade que nos faz comportar adequadamente em qualquer lugar do planeta, de mostrar que somos de fato gente boa, que não se deixa abalar por um mau resultado de um jogo de futebol, ou que não pode ser modificado por algumas cervejas a mais.
Temos a obrigação de mostrar que somos educados, cordatos e que sabemos respeitar a casa dos outros como se fosse a nossa própria casa. Pois se não respeitamos a dos outros como poderemos exigir que nos respeitem?
Certamente a Seleção brasileira vai voltar a jogar em Boston, e espera-se que a parte da torcida que não soube se comportar adequadamente o faça de modo a justificar a boa fama da maioria da nossa gente. Do contrário seremos sempre equiparados à minoria de desordeiros e vândalos que aproveitaram a chance – rara – de extravasar e extrapolar quando não podiam fazê-lo.
*Jornalista e radialista da Rede ABR de Massachusetts