Comunidade Estados Unidos

Brasileiros nos EUA: entre o ser e não ser latino

A resposta parece simples, mas para muitos brasileiros nos EUA, ser latino – ou não – pode ser uma questão de identidade, pertencimento e até resistência.

No exterior, o rótulo “latino” pode abrir portas de conexão, mas também escancara diferenças culturais que muitos brasileiros só percebem depois de imigrar. Foto: Wikimedia Commons

Quem é brasileiro morando nos Estados Unidos com certeza já preencheu algum formulário que pergunta sua etnia, origem ou se é latino. No Census, por exemplo, “latino” é uma categoria oficial, mas muitos brasileiros ficam em dúvida se devem ou não se identificar assim. Isso porque, apesar de o Brasil ser parte da América Latina, a identificação com o termo “latino” ainda é controversa entre os próprios brasileiros.

Uma pesquisa conduzida pela USP mostra que só cerca de 4% dos brasileiros se reconhecem como latino-americanos, dado que revela um distanciamento simbólico do país em relação à sua própria região. Essa distância não é só uma questão de números: reflete fatores culturais, históricos e educacionais que moldam como os brasileiros se veem no mundo e no contexto latino-americano.

Para brasileiros nos EUA, a questão ganha uma dimensão ainda maior. Muitos enfrentam o desafio de serem agrupados como “hispânicos” ou “latinos” em estatísticas e políticas públicas americanas, mesmo quando não se identificam com esses termos. O Census Bureau, por exemplo, historicamente não classifica brasileiros como latinos, pois a categoria costuma ser reservada a pessoas de origem hispânica, ou seja, de países de língua espanhola.

Essa distinção tem impactos reais na comunidade brasileira nos Estados Unidos. Além de influenciar dados oficiais, ela afeta a forma como brasileiros acessam serviços, oportunidades e redes de apoio que são direcionadas para “latinos”. Por isso, analisar esse distanciamento simbólico ajuda a explicar parte da complexidade da identidade brasileira no exterior.

Adriana Medeiros, que mora em Los Angeles desde 2017, conta que nunca tinha refletido sobre o tema no Brasil. “Passei a me identificar como latina só aqui. E isso me trouxe um senso de pertencimento”, afirma. Já Thiago dos Santos, que estuda em San Diego, compartilha uma visão distinta: “A verdade é que a própria comunidade latina não me reconhece como um. E eu não falo nada de espanhol”, diz. Para ele, a identidade de “latino” nos EUA ainda está muito atrelada à língua e à cultura hispânica, o que deixa muitos brasileiros em um espaço de “quase pertencimento”.

Além do aspecto linguístico, a própria formação cultural e educacional no Brasil reforça esse distanciamento. Pesquisas recentes mostram que muitos brasileiros têm pouco contato com a cultura latino-americana, o que contribui para uma percepção de que o Brasil é diferente, separado dos demais países da região. Estereótipos e reducionismos também reforçam essa ideia, criando barreiras para uma identificação mais forte com a América Latina.

No fim, a identidade do brasileiro no exterior é marcada por essa dualidade entre pertencimento e distinção. Mesmo fazendo parte geograficamente da América Latina, muitos brasileiros se veem como únicos, uma característica que acompanha a experiência migratória e que influencia como eles se posicionam diante das categorias e políticas nos EUA.

Entender esse cenário é fundamental para construir diálogos e políticas mais inclusivas e que reflitam a diversidade real da comunidade brasileira fora do Brasil.

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