Histórico

DNA mapeia origem de brasileiros na África

Um estudo genético identificou, pela primeira vez por meio de DNA, as regiões da África que mais contribuíram para a formação do povo brasileiro.

O trabalho, liderado pelo médico geneticista Sérgio Danilo Pena, professor titular de bioquímica da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), indicou que a maior parte dos ancestrais do grupo analisado veio do Centro-Oeste da África – região que inclui Angola, Congo e Camarões – seguida pelo Oeste (Nigéria, Gana, Togo, Costa do Marfim) e pelo Sudeste africano.

Segundo o estudo, que analisou o DNA mitocondrial dos indivíduos, 44,5% tinham uma ancestral no Centro-Oeste da África, 43%, no Oeste da África e 12,3%, no Sudeste, na região onde fica hoje Moçambique.

Chamado de marcador de linhagem, o DNA mitocondrial é passado pela mãe para os filhos. Na prática, o DNA mitocondrial de uma africana 400 anos atrás é idêntico ao de um descendente no Brasil, se não tiver havido nenhuma mutação.

Apesar de ter sido feito em um grupo negros em São Paulo, o estudo tem uma representatividade nacional porque, com as migrações internas, durante e após a escravidão, a cidade se tornou, de certa forma, um caldeirão genético do Brasil.

Segundo Pena, a maior parte dos resultados confirma teses históricas sobre o tema, inclusive a descoberta mais recente de estudiosos de que Moçambique teve uma contribuição muito mais expressiva do que se acreditava antigamente.

Documentos queimados

Segundo o estudo, a origem dos escravos levados para o Brasil sempre foi um assunto nebuloso, sem documentação completa. Para evitar pedidos de indenização, documentos históricos sobre a escravidão foram queimados após a abolição, em 1888.

Acredita-se que entre 3,6 milhões e 4 milhões de escravos tenham sido trazidos para o Brasil entre 1550 a 1870.

Mas não há dados, por exemplo, sobre o enorme número de africanos transportados ilegalmente após 1830, quando o Brasil assinou um tratado com a Inglaterra para acabar com o comércio de escravos. A falta dessas informações dificulta que se saiba, exatamente, de onde vieram africanos trazidos para o Brasil.

Além disso, o porto de embarcação, registrado nos arquivos, não reflete, necessariamente, a origem geográfica dos escravos que, muitas vezes, eram capturados no interior, a centenas de quilômetros do litoral.

“Cada porto drenava de uma área territorial grande. Às vezes, as pessoas eram capturadas e tinham de viajar mil quilômetros antes de chegar ao litoral”, diz Pena, que também faz incursões pela história e pela antropologia social.

“Vingança do derrotado”

Para chegar aos números para cada região, Pena analisou as linhagens materna e paterna dos 120 indivíduos que participaram do estudo. O objetivo era chegar aos seus ancestrais mais distantes dos dois lados.

Isso é possível pelo estudo do cromossomo Y, que só passa de pai para filho, e do DNA mitocondrial, que é herdado (pelos dois sexos) da mãe.

Esses marcadores de linhagem, salvo casos de mutação, não se misturam com os outros genes e mantêm-se praticamente inalterados ao longo das gerações.

Assim, um negro brasileiro “carrega” no cromossomo Y informações genéticas do seu ancestral masculino de diversas gerações anteriores e no DNA mitocontrial, da ancestral feminina.

Bantus

Para discriminar as diferentes regiões, Pena contou com o princípio genético que chama de “vingança do derrotado”.

Ele explica: um grupo chamado Bantu, que predominava no Oeste da África, espalhou-se pelo continente, e os homens passaram a se reproduzir com mulheres de outras regiões.

Assim, o fruto desse “cruzamento” passou a carregar também o DNA mitocondrial das mães, que acabaram deixando nos filhos gerados pelos homens do grupo dominador Bantu as informações genéticas sobre a região geográfica a que pertenciam.

“Quando o Bantu chega numa determinada região, ele, como dominador, se reproduz com as mulheres da região e aí o DNA mitocondrial das mulheres ‘entra’ na população Bantu. Por isso pudemos diferenciar os três grupos”, afirma Pena.

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