Histórico

Jurassic Park

Roberto Ribeiro
rllsn65@gmail.com

De repente você se lembra de que precisa enviar uma mensagem. Mete a mão no bolso, tira o celular e: a) segura o celular com uma mão e, com o indicador da outra, expressão tensa, digita o texto com dificuldade? Ou b) apoia o celular com oito dedos e, com ambos os polegares, começa a digitar a mensagem freneticamente?

Se sua resposta foi a), você está confinado numa jaula ao lado da minha. E, ainda que tenha escolhido b), se colocou a mão no bolso para pegar o celular, você deve estar, sob cuidadosa vigilância, transitando solto pela antessala do parque no setor Cretáceo. Gente que é ser humano hoje em dia já vive com o celular na mão.

Sou jurássico. Sou parte desse parque que ainda mantém seres quase extintos em exposição. Visto pelos observadores com menos de 25 anos com comedida ironia entre cochichos e risinhos. Sou daqueles exemplares que acreditam que o desenvolvimento tecnológico, especialmente no setor das comunicações, é na verdade um amplo projeto conspiratório que tem como objetivo único humilhar representantes dessa era geológica.

Ainda compro CD, imagine! Uso agenda do ano comprada em papelaria! Vejo meu celular como os cientistas veem o cérebro humano: sei que estou usando somente 5% de sua capacidade. E daí? Vou passar minha vida exercitando a massa cinza para conseguir, depois de muito esforço, utilizar 5,01% dela? Ora, faça-me o favor!

Meu celular faz e recebe ligações. Mando e recebo SMSs, incrível!, E até mesmo, pasmem!, me comunico por watzap, wastap, what… Enfim, chega! Se com isso ele já congela, já depende de sinal… e tem sinal medido por barrinha, por anteninha, 3G, 4G, sei lá quantos Gs, parece até coisa de sexo; uaifai (deve ser invenção mineira)… Não! Não quero nada a mais! Não quero carregar um inimigo mortal no bolso. Não quero ser responsável pelo esmigalhamento de um aparelho quase anímico.

E eu estou me atendo ao celular. Um aparelhinho que já foi menor, mas que ainda cabe na mão. Que tal um notebook? Ou é laptop? Ou tablet? Me refiro a esse antagonista portátil tão popular hoje em dia. Pra mim, quem consegue configurar, instalar, baixar ou atualizar programas, aplicativos, periféricos, etc sem perder horas da existência, ganhar cãs prematuras ou pagar de uma vez a porcaria de um técnico, não pertence à minha raça.

Por falar em técnico, ô raça! (Pronto, já perdi 9 leitores!) Não existe um que não explique a você como se estivesse explicando a um colega. E na mesma velocidade. Para! Desacelera! Se eu entendesse o que você está dizendo nessa rapidez, querido, não precisaria te consultar! Mas vamos dizer que ele tenha explicado, passo a passo, o que você tem que fazer para conseguir o resultado desejado. Você acha que entendeu tudo e vai para casa, feliz, colocar em prática o que lhe foi transmitido em teoria. Pobre dinossauro! Melhor começar a urrar e desossar um cabrito.

O caminho para qualquer ação num desses artefatos sádicos é comparável à árvore genealógica de um coelho. A cada janela, pasta ou arquivo abertos, uma infinidade de alternativas é apresentada. E em algum momento, assim como 2 e 2 são quatro, nenhuma das infinitas opções atenderá às indicações do compreensivo técnico. Isso sem mencionar o execrado click do mouse quando você percebe, num átimo, que clicou no lugar errado. Impossível retroceder. Torna-se o click do cão do revólver batendo no tambor na roleta russa: você se f@#&%, ou quase.

Mas timoneando um mouse você ainda está navegando num mar de rosas! E quando você tem que se valer do Retângulo das Bermudas, aquele espaço dos portáteis abaixo do teclado que pretende substituir o mouse, mas faz você se perder completamente? Achar o cursor já é uma dificuldade. Dominá-lo então é quase impossível. É tão misterioso pra mim como tocar trombone de vara. Acertar a nota ou o local do click me parece obra do acaso. E quando a setinha está exatamente em cima de onde se quer clicar, a própria pressão do dedo faz com que a maldita saia do lugar, provocando aquele arrepio pelo contato do aço da arma com a têmpora.

Não, não posso com isso! Sou do tempo em que antivírus chamava-se vacina. Google Maps era guia. GPS, o tiozinho da esquina.

Sou atração do parque, parente de jacaré, primo de camaleão!


Roberto Ribeiro nasceu nos EUA, é ator formado pela Escola de Arte Dramática – USP, trabalhou por 3 anos no México na Universidade de Colima e é há 11 anos funcionário do Banco do Brasil Recém chegado a Miami, no Brasil participou de inúmeros espetáculos teatrais e produções de TV.

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