Celebridades, empresários, políticos e até esportistas reagem à medida no Arizona e pedem mudanças imediatas na área de imigração. Obama promete agir contra “irresponsabilidade”
A reação nos Estados Unidos à recente lei sancionada pela governadora do Arizona, Jan Brewer, que criminaliza indocumentados e dá poder à polícia local de questionar a situação imigratória nas ruas, acabou incendiando um tema que estava meio adormecido na sociedade americana. As críticas vieram de todos os lados, a começar do próprio presidente Barack Obama, que parecia conformado com a falta de apoio no Congresso à reforma. “O governo vai agir para alterar as leis de imigração em um nível nacional, pois caso contrário o caminho estará aberto para a irresponsabilidade de outros”, disse Obama.
A dele não foi a única voz a se levantar contra as novas medidas no Arizona. O ex-procurador-geral daquele Estado, Grant Woods, usou a sua amizade com a governadora Brewer para tentar convencê-la de que a medida não é positiva. “Senti que meus argumentos não surtiram efeito, pois ela acredita que a população local vai apoiar o ato, que deve custar caro ao Arizona em termos de batalhas judiciais. A medida não encontra embasamento constitucional”, afirmou Woods.
Outro apoio de peso foi dado pela cantora colombiana Shakira. Em passagem pelo Arizona, ela agendou uma reunião com o prefeito de Phoenix, Phil Gordon, com o intuito de ajudar em uma campanha contra a nova lei. Shakira deve se encontrar também com famílias imigrantes e, através de seu porta-voz, afirmou que a reforma é o melhor caminho para os Estados Unidos. A artista, inclusive, já esteve na Casa Branca e opinou sobre o assunto com Obama.
A medida afetará também a área esportiva. O presidente da Major League Baseball, a liga profissional de basebol aqui nos EUA, Bud Selig, ameaça transferir o jogo das estrelas do esporte em 2011, a princípio marcado para Phoenix. A partida, que atrai milhares de torcedores de todos os estados, certamente geraria dinheiro para os negócios no Arizona, mas, segundo Selig, a nova lei não combina com um esporte que têm grande presença de atletas de origem hispânica.
Mesmo os empresários, como Tamar Jacoby, presidente de uma federação de empregadores que defende leis mais condescendentes com os imigrantes, estão se manifestando favoráveis à uma reforma imediata. “O momento é propício para mudanças na lei. Para os democratas, trata-se de uma oportunidade de mostrar quem realmente está emperrando o debate”, resume.
Já o ex-presidente Bill Clinton procurou concentrar seus comentários na necessidade de uma reforma imigratória imediata. “Precisamos de mais imigrantes neste país, até como forma de colocarmos a nação de volta ao trilhos, depois da recessão. O Congresso precisa analisar a questão com mais cuidado. É claro que eu não gostei da medida sancionada no Arizona e me entristece ver o que acontece diariamente nas fronteiras”, disse Clinton, lembrando que uma das grandes virtudes dos Estados Unidos é ter pessoas de várias nacionalidades, que são bem-sucedidas.
Para o ex-presidente democrata, a entrada de mais gente no sistema, pagando impostos e gerando empregos, só pode acontecer com um aumento da imigração responsável. “Isso deve ser parte da estratégia”, disse Clinton.
O apoio à reforma e as críticas à nova lei no Arizona não foram suficientes para impedir que a Secretaria de Relações Exteriores do México emitisse uma recomendação aos mexicanos de passagem por aquele Estado. “O ambiente adverso é claro. Por isso, enquanto não houver critérios definidos sobre o assunto, qualquer cidadão mexicano poderá ser molestado e questionado no Arizona”, adverte o comunicado.
Justificativa frágil
Um dos argumentos do senador estadual Russell Pearce para a elaboração da tal lei no Arizona foi a de que o Estado apresenta altos índices de violência, segundo ele devido à presença maciça de imigrantes. A ideia não se sustenta, como afirma a advogada Iara Morton, apresentando estatísticas para sustentar sua opinião.
“Muito pelo contrário, as taxas de criminalidade no Arizona estão caindo. Além do mais, há estudos que mostram que os imigrantes são menos propensos a cometer crimes e proporcionalmente estão em menor número nas prisões em comparação aos cidadãos”, justifica a advogada, lembrando que grande parte das ocorrências naquele estado são justamente de sequestros e assassinatos nos quais os indocumentados são vítimas dos cartéis.
De fato, de acordo com dados do U.S. Bureau of Justice, o número de crimes violentos no Arizona caiu de 512 (para cada 100 mil habitantes) em 2005 para 447 em 2008. Ainda, segundo pesquisa da fundação Americas Majority, uma entidade conservadora, a criminalidade é menor em estados com maior presença de imigrantes, como o Arizona. De 1999 a 2006, o índice caiu mais de 13% nos 19 estados com mais indocumentados no país, em comparação com a queda de 7% nos outros 32 estados.
Mas mesmo que o Congresso não inicie o debate sobre a reforma imigratória, os indocumentados do Arizona ou de outros estados que cogitaram a hipótese de aplicar medidas semelhantes podem ficar tranquilos. Especialistas jurídicos acreditam que a norma não deverá entrar em vigor antes de2012, tantas são as ações arguindo a constitucionalidade da legislação. “Além do mais, esperamos que até lá, o Congresso já tenha apresentado uma reforma justa e ampla”, torce um ativista.