Histórico

Liberdades paralelas

Jorge Moreira Nunes

Existe um paralelo oculto entre o debate pela aprovação da 13ª Emenda Constitucional, que aboliu a escravidão nos Estados Unidos em 1865, e o debate pela legalização de imigrantes indocumentados de agora. A lei que propunha a emenda de 1865 havia sido aprovada pelo Senado, mas ficou quase um ano empacada na Câmara, exatamente como o projeto de reforma imigratória votado no ano passado no Senado e paralisado na Câmara de hoje.

Os opositores da emenda libertadora não admitiam a igualdade racial, e julgavam que os negros não podiam ser considerados cidadãos por direito, argumento de certa forma bem parecido com o que é usado hoje pelos que são contra a legalização de milhões de pessoas que vivem em estado de sub-cidadania nos Estados Unidos.

O impasse ideológico do século 19 resultou numa guerra civil entre o norte abolicionista (os Federalistas, que queriam a abolição da escravatura e a preservação da união) e o sul escravocrata (os Confederados, escravagistas que desejavam a divisão do país, ou secessão). A vitória do governo federalista liderado pelo presidente Lincoln só veio depois de uma luta que durou quatro anos e custou a vida de 600 mil americanos.

A 13ª Emenda foi aprovada, o país libertou seus escravos e a união foi preservada. O resto é História, e o sucesso da democracia americana desde então provou a validade da decisão libertária aprovada na 13ª Emenda Constitucional.

A luta pela aprovação de uma reforma imigratória guarda muitas semelhanças com a luta pela 13ª Emenda. Ambas dividiram perigosamente o país, a primeira de forma tão grave que causou uma guerra civil.

Hoje, há cerca de 11 milhões de trabalhadores sem documentos nos Estados Unidos, em condições de cidadania sob vários aspectos bem parecidas com as dos escravos do século 19, apesar da evolução moral da sociedade que separa as duas épocas. Mais uma vez há um debate divisório no país sobre uma causa libertária, agora tendo como objeto a vida dessa gente que se esconde nas sombras da ilegalidade, e que não pode ser deportada sem que haja um choque econômico catastrófico no país.

Um fato interessante na comparação é a inversão dos sinais partidários. Em 1865, o Partido Republicano era libertário e o Democrata conservador. Hoje, são os republicanos que impedem a libertação social de milhões de famílias, ao recusarem-se a votar a lei imigratória aprovada no Senado. A omissão praticamente obriga o presidente Obama a entrar com ações executivas para resolver o problema, baixando as medidas que foram anunciadas esta semana.

A vida de milhões de pessoas está a uma canetada de entrar para a História.

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